Foto: Marcelo Oliveira (Diário)
Uma medida adotada pelo Complexo Hospitalar Astrogildo de Azevedo tem gerado polêmica nas redes sociais entre profissionais que defendem o parto natural e gestantes. Em documento interno, enviado em 7 de janeiro aos médicos obstetras que atuam no hospital, a diretoria da instituição comunica que "as parturientes que terão parto normal deverão ser assistidas exclusivamente pela equipe de enfermagem e técnicos da instituição". Enfermeiras obstétricas, doulas e fisioterapeutas, por exemplo, que acompanham gestantes durante o pré-natal, estariam impedidas de entrar nas maternidade durante o trabalho de parto. O diretor técnico do complexo hospitalar, Luiz Gustavo Thomé, que assinou o documento ao lado da diretora clínica, Jane Costa, explica que a decisão partiu da preocupação com os altos índices de contaminação pela Covid-19 nos últimos dias.
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- O Hospital não é contra doula e parto normal. Não interferimos na conduta médica. Não estamos bloqueando a entrada. Estamos abertos a conversar. Se o médico vier aqui e disser que a gestante precisa da presença da doula, vamos conversar. Não é uma violência obstétrica, bem pelo contrário. Estamos oferecendo os nossos profissionais internos capacitados - garante Thomé.
O hospital, que possui a maior maternidade da Região Central, realiza cerca de 130 partos por mês. Mais de 90% deles são cesarianas. O complexo hospitalar também possui UTI neonatal, referência para a região. Outra preocupação exposta pela direção é quanto à regulamentação do trabalho de profissionais externos dentro da maternidade. Thomé explica que a instituição pretende normatizar a atividade dos profissionais terceirizados nas salas de parto.
- Preciso de normas para garantir a segurança dos nossos funcionários e das gestantes e dos bebês. Houve esse aumento de casos de Covid-19. Nós vamos usar as nossas doulas, temos enfermeiras com esse treinamento. Não é que a gestante vai chegar aqui e não vai ter o parto humanizado e natural que deseja. Ela vai ter, mas com os nossos profissionais. Nós entendemos que é importante, em um parto que dura horas, ter uma pessoa de confiança ao lado - afirma.
PROFISSIONAIS DE SAÚDE E GESTANTES SÃO CONTRA DETERMINAÇÃO
Por outro lado, as profissionais terceirizadas contratadas e as próprias gestantes questionam que o hospital não está garantindo o direito da mulher de escolher quem a acompanha no parto. A enfermeira obstétrica e doula Ana Paula Perlin, que atua na Gestar Nascer Amar, avalia a determinação do hospital:
- As mulheres estão se mobilizando em todo o país pelo direito ao parto humanizado e normal, que é o ideal para a saúde de mães e bebês. Quem gostaria de ter parto normal está abalada com essa decisão. Foi criado um vínculo conosco, elas estavam seguras de que estaríamos no parto, e isso não vai acontecer. Não deixa de ser uma violência obstétrica porque estão impedindo que a mulher escolha quem vai poder a acompanhar no parto - avalia.
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As enfermeiras, doulas e fisioterapeutas auxiliam com o apoio emocional e físico durante o parto. Elas garantem que os desejos da gestante para o momento do nascimento do bebê sejam cumpridos. O trabalho começa antes da chegada ao hospital, ainda na casa da mulher, quando ela entra em trabalho de parto. A partir do momento em que o trabalho se torna ativo, a enfermeira vai até o hospital com a gestante. Estas profissionais não executam serviços técnicos, como o monitoramento dos batimentos cardíacos, por exemplo, durante o processo de nascimento do bebê. A enfermeira obstétrica Lidiane Carvalho de Souza, que trabalha na equipe da Bem Nascer SM, diz que a proibição de entrada já havia acontecido no começo da pandemia, quando a doença ainda era desconhecida e os testes eram escassos. Ela conta que o teste de Covid-19 negativo sempre foi uma exigência do hospital. A enfermeira recebeu a notícia com surpresa e reclama da falta de justificativa para a medida.
- Não estávamos esperando. Não houve nenhuma explicação ou justificativa. Tentamos contato por email com o hospital, mas não obtivemos resposta. Nossas pacientes ficaram muito abaladas, ansiosas e frustradas. A pandemia já teve um estado muito mais alarmante. Não acho que seja uma justificativa plausível. Existem maneiras de barrar a contaminação sem precisar proibir nossa entrada. A política de saúde da mulher inclui também o sistema privado, e um dos direitos é ter uma equipe multiprofissional acompanhando o parto. É uma das formas de combater a violência obstétrica.
INSEGURANÇA EM GESTANTES
A personal trainer Luiza Peixe (foto ao lado com o marido Lucas Amorim), 30 anos, grávida de 39 semanas, pretende ter a filha no hospital. A data prevista de parto é 19 de janeiro, na próxima semana. Ela conta que tomou um susto quando viu a nota da instituição nas redes sociais. A gestante tem sido acompanhada por um enfermeira obstétrica desde a 30ª semana de gestação.
- Levamos um susto, estava tudo certo, dentro do programado. Nos preparamos para ter um parto normal, com o auxílio que a gente precisa. Agora estou submetida a uma equipe que não conheço, sem o apoio que a enfermeira obstétrica que nos acompanha nos daria. Bate uma insegurança. Já criamos um vínculo afetivo, de confiança, ela (enfermeira obstétrica) nos explicou tudo do pré-parto, parto e pós-parto. Tudo que eu sinto, ela me atende de imediato. Eu teria que escolher entre o pai da minha filha e a enfermeira obstétrica. Inicialmente, os dois iriam entrar e ficar comigo - relata.